Quarta-feira, 20 de novembro de 2024

A Barbie é todas nós

A Barbie é todas nós, sim, e não me venha com essa de padrões estéticos, porque ela já se metamorfoseou em mil e uma versões para atender a essa demanda da sociedade. A estreia do live action (versão com personagens reais) do filme trouxe de volta uma série de discussões como essa, já deve estar enlouquecendo as feministas radicais e incomodando quem acha que empoderamento exige deixar de lado o seu lado feminino. Então, quero já vou começar com a minha impressão geral do filme da Barbie: eu amei! Achei genial! Dinâmico, engraçado, visualmente lindo e com muitas “sacadas” espertas de marketing.

Isso dito, deixa eu esclarecer os meus parâmetros para essa análise: trata-se de um filme de entretenimento, e o público-alvo não é o infantil. Pelo contrário, ele é direcionado àquela mulher que brincou com a boneca na sua infância, que sonhou ser ela, e que a viu ter que se adaptar aos novos tempos – a boneca e si mesma, ambas “rebolando” para entender o seu lugar em um mundo que passou a exigir cada vez mais das mulheres e para as mulheres.

Se, de um lado, lutamos por equidade, por outro, nos sobrecarregamos em excesso para tentar atingir tudo-ao-mesmo-tempo-agora: o sucesso profissional, a independência financeira, a liberdade emocional, a plenitude espiritual, a perfeição física e, ufa!, a serenidade absoluta. Oi?

O filme acaba sendo o manifesto da marca fabricante, a Mattel, que aproveita a oportunidade para explicar o propósito da Barbie, o quanto ela quer acolher a mulher e tenta correr junto ao tempo para ser o seu paralelo. Se, por um lado, existe a almejada perfeição na boneca, ela cai diante das condições humanas. A vida real, definitivamente, não é perfeita – principalmente, os relacionamentos (inclusive, o consigo mesmo).

Enquanto na imaginação infantil podemos ser o que quisermos, na vida adulta essa premissa é um objetivo a ser alcançado – não é tão simples assim. E a constante luta pelo poder nos relacionamentos acaba sendo um fator de desequilíbrio: em Barbieland, o mundo perfeito é governado por mulheres e os homens são inúteis – esse, para mim, é o ponto fraco do filme, porque acredito no equilíbrio. Mas precisamos entender que Barbieland é um mundo imaginado por…meninas. É apenas quando surge a mulher que ela compreende que também não é o centro do universo. Mas não tem jeito, o Ken sempre foi apenas um acessório da protagonista – e essa é uma questão que, talvez, a Mattel precise rever. Sim, queremos uma realidade de mulheres fortes e representativas. Contudo, será que realmente queremos um mundo de homens fracos?

Para além da questão da guerra dos sexos, há, ainda, reflexões sobre a fugacidade da vida, a importância da experimentação de cada momento, a realização de que, embora findável, viver sentindo é mais valioso do que apenas ver a vida passar… E isso toca o coração das mulheres maduras, que se reconhecem na passagem do tempo da menina que escovava os cabelos da boneca à que passa a escovar os cabelos da filha. A Barbie é praticamente como o bastão que a gente passa para quem segue na corrida da vida.

E se não bastasse as provocações suaves da história, o filme traz diversos momentos nostálgicos que nos dão o aconchego da lembrança, e, eventualmente, uma narradora para nos “dar a real” e, até mesmo, fazer troça dos acontecimentos (inclusive, da própria Mattel). Eu sempre digo que só alguém muito inteligente consegue fazer graça e rir de si mesmo.

Vale a pena assistir. Mas assista com o coração aberto, sabendo que ele pretende apenas ser o filme da Barbie, e não uma obra prima para cinéfilo ver. E é por isso que ele é tão gostoso, cumprindo o que se propõe e deixando quentinho o coração da menina que ainda mora dentro da gente.

Ali Klemt

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