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Por Redação Rádio Pampa | 16 de fevereiro de 2023
Foi a partir de uma exposição organizada em 2006 na Oca, no Parque Ibirapuera, em São Paulo, que o paleontólogo Luiz Eduardo Anelli identificou um incômodo. “Poxa, porque a Argentina já descreveu 150 espécies de dinossauros e o Brasil só tem 23?”, perguntou à época.
Com esse questionamento, nasceu a ideia de escrever um livro sobre os grandes répteis do passado que viveram onde identificamos hoje o território brasileiro. Porém, passados alguns anos da primeira edição do texto, a obra já estava obsoleta.
“Nesses últimos 15 anos, o número de dinossauros identificados no Brasil se multiplicou e eu precisava fazer uma atualização”, conta o pesquisador, que também é diretor da Estação Ciência da Universidade de São Paulo (USP).
Surgiu, assim, o livro Novo Guia Completo dos Dinossauros do Brasil, lançado recentemente pela Editora da USP (Edusp) e pela Editora Peirópolis.
A obra traz detalhes sobre 54 espécies catalogadas de dinos “brasileiros” e explica todas as evidências sobre o surgimento do planeta e da vida ao longo de milhões de anos. As ilustrações que acompanham o texto foram feitas pelo paleoartista Julio Lacerda.
Vale lembrar, como mostra a escala abaixo, que os dinossauros foram os seres dominantes durante a Era Mesozoica, que compreende um período que vai de 252 milhões a 65,5 milhões de anos atrás.
Em entrevista à BBC News Brasil, Anelli destacou sete espécies descritas no Brasil com características interessantes e curiosas, como você confere ao longo da reportagem.
1. Staurikosaurus, o ancião
Há um motivo para o Staurikosaurus pricei ser a estrela da capa do livro: ele é considerado o dinossauro mais antigo já encontrado no mundo.
As datações de rochas próximas revelam que esse animal viveu há 233 milhões de anos. Com isso, ele é cerca de 1,8 milhão de anos mais antigo que alguns outros dinos descobertos na Argentina, como o Eoraptor e o Herrerasaurus.
“No que hoje conhecemos como Rio Grande do Sul possivelmente nasceram as primeiras linhagens de dinossauros que iriam colonizar e dominar o mundo ao longo dos próximos 170 milhões de anos”, estima Anelli.
Atualmente, o único fóssil conhecido do Staurikosaurus está no Museu de Anatomia Comparada da Universidade Harvard, nos Estados Unidos.
2. Buriolestes, o precursor
Anelli destacou o Buriolestes schultzi por causa de uma aparente contradição. “A comunidade científica ficou um tanto chocada ao saber que o Buriolestes era um bípede carnívoro/faunívoro que deu origem às linhagens posteriores dos dinossauros quadrúpedes herbívoros”, resume.
Os especialistas tiveram a sorte de encontrar dois esqueletos praticamente completos dessa espécie. Elas estavam com o crânio preservado, inclusive com as massas do que foram os cérebros desses animais no passado.
“Com isso, foi possível obter imagens de tomografia para conhecer todas as formas, protuberâncias e características do cérebro dessa espécie”, diz.
““Descobrimos assim o ‘tataravô’ dos dinossauros pescoçudos, então esse é um patrimônio da biologia e da história natural”, classifica o paleontólogo.
3. Ubirajara, o polêmico
Catalogado em 2020, o Ubirajara jubatus também é considerado uma peça rara. “Ele é o primeiro dinossauro não voador encontrado na região do Crato, no Ceará, e possui uma penugem, ou penas”, descreve Anelli.
“Além disso, o Ubirajara tinha dois pares de penas longas no dorso, muito parecidas com aquelas que são observadas hoje nas aves-do-paraíso [típicas da Oceania]”, complementa.
De acordo com o cientista, uma possibilidade é que essas estruturas servissem para vibrar e chacoalhar durante os ritos de acasalamento – característica que, diga-se, algumas aves mantêm até os dias atuais.
E esse não é o único comportamento que aproxima aves e dinossauros: ambos dormem (ou dormiam) com o pescoço enrolado no corpo, constroem (ou construíam) ninhos e botam (ou botavam) ovos com características similares.
Infelizmente, o Ubirajara está envolvido numa polêmica. “Ele foi levado para a Alemanha de modo suspeito e os pesquisadores, bem como o museu que hoje o hospeda, se recusam a devolvê-lo”, informa o livro.
“Mas há rumores de que o Ubirajara está voltando para casa em breve”, completa.
4. Oxalaia, o pescador
Esse gigante foi caracterizado a partir de dois fragmentos: a extremidade superior do focinho e um pedaço da maxila esquerda. Isso porque as rochas onde estavam esses fósseis, numa ilha no Estado do Maranhão, sofrem com os efeitos das ondas e das marés – daí boa parte do material se degradou.
Anelli chama a atenção para o fato de que, à época em que o Oxalaia quilombensis existiu, a América do Sul e a África tinham acabado de se separar (antes, elas integravam um supercontinente conhecido como Gondwana).
Por isso, há muitas similaridades entre esse dino brasileiro e alguns outros que foram descobertos na costa africana. “Ao que tudo indica, o Oxalaia era um dinossauro pescador”, complementa o antropólogo.
O nome científico da espécie faz uma referência à divindade afro-brasileira Oxalá e aos assentamentos quilombolas maranhenses.
5. Ibirania, o nanico
Há 85 milhões de anos, a região que hoje conhecemos como o interior de São Paulo não era um dos lugares mais fáceis para se viver.
Recursos como água e comida eram escassos – e os poucos animais que se aventuravam por essas terras precisaram se adaptar. Um exemplo desse processo é o Ibirania parva, um dinossauro pescoçudo nanico.
“Ele muito provavelmente reflete um momento do cretáceo que tinha um clima muito seco, com pouca disponibilidade de alimentos”, avalia Anelli.
Por uma estratégia evolutiva em um tempo de vacas magras, o Ibirania era pequenino, ainda mais quando comparado a outros dinossauros que surgiram em épocas posteriores.