Domingo, 22 de dezembro de 2024

Bactérias para emagrecer? Ciência aponta uma saída

Obesidade é uma doença multifatorial, apontada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como um dos grandes desafios da modernidade. Em maio de 2022, a agência publicou um alerta para os países europeus, chamando atenção para o fato de que dois terços dos adultos e um terço das crianças do continente apresentam sobrepeso ou obesidade. Além disso, nenhum dos 53 países da zona europeia da OMS está em condições de cumprir a meta de reduzir as taxas de obesidade até 2025. Obesidade e sobrepeso crônicos figuram entre as principais causas de mortalidade e invalidez na Europa.

Há alguns anos, estudos com bactérias intestinais pareciam indicar uma saída para o problema. Pessoas obesas apresentavam um conjunto de bactérias no intestino, a microbiota intestinal, diferente do visto em pessoas com peso saudável. Algumas espécies de bactéria eram mais comuns e abundantes em obesos, e outras em pessoas de peso saudável. Esse foi o primeiro sinal de que havia algo interessante ali. E como boa ciência é feita com boas perguntas, pesquisadores da área questionaram: será que as bactérias do intestino têm relação de causa e efeito com obesidade? E será que, se isso for verdade, podemos manipular estas bactérias para ajudar no emagrecimento?

Um grupo de cientistas, incluindo pesquisadores dos EUA, Dinamarca e França, fez um estudo usando microbiota intestinal de gêmeos discordantes para obesidade, ou seja, um gêmeo obeso, e um gêmeo com peso considerado saudável. A microbiota dos gêmeos foi usada para alimentar camundongos, em um ambiente controlado. Os camundongos usados eram “germ-free”, ou livres de germes, o que significa que não tinham microbiota própria já desenvolvida: todas as bactérias viriam dos doadores humanos. As condições dos camundongos eram exatamente as mesmas. A única diferença era o “suplemento” que recebiam dos humanos.

Quando alimentados com uma dieta pouco calórica, os animais que receberam a microbiota saudável permaneceram magros, enquanto os animais que receberam a microbiota “obesa” engordaram. Mesmo comendo a mesma dieta. E o mais interessante, quando os camundongos eram colocados na mesma gaiola, misturando os magrinhos com os gordinhos, os camundongos com sobrepeso emagreciam. A microbiota dos animais com sobrepeso foi colonizada pelas bactérias dos animais mais magros. Isso era esperado, pois a microbiota de obesos é menos diversa, e provavelmente as diferentes espécies vindas dos animais magros acharam bastante espaço ali para se instalar. O contrário não ocorreu: os animais magros não foram colonizados pelas espécies dos obesos.

Mas antes de você imaginar que para emagrecer então, é só morar com uma pessoa mais magra do que você, lembre-se que os camundongos são coprofágicos, ou seja, comem as fezes uns dos outros. Por isso, os pesquisadores sabiam que uma transferência natural de microbiota intestinal ia acontecer.

Quando fizeram o mesmo experimento com uma dieta hipercalórica, o resultado já não foi o mesmo: os animais com sobrepeso não conseguiram emagrecer, mostrando que existe um balanço entre a dieta e a microbiota.

Testes de transferência de microbiota em humanos começaram em seguida, com alguns bons resultados. Para infecção intestinal causada por bactérias, o procedimento mostrou-se muito superior ao tratamento com antibióticos, e também ajudou em alguns tipos de diabete. Mas para obesidade em humanos, infelizmente, não deu muito certo. Estudos recentes mostraram que transferir microbiota não ajudou adolescentes obesos a perder peso.

A pesquisa continua, e quem sabe um dia conseguiremos controlar melhor a obesidade. Até lá, não custa lembrar que mesmo ideias que parecem muito boas precisam ser testadas, e que nem tudo que dá certo em camundongos dá certo em humanos.

 

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