Segunda-feira, 03 de fevereiro de 2025

“Epidemia” de médicos influencers acende alerta no Conselho Federal de Medicina

O número de médicos que fazem sucesso nas redes sociais vem aumentando cada vez mais. Numa pesquisa no Google usando “medical influencers”, é possível ver listas e listas deles no Instagram, a plataforma preferida da classe. Há de nanoinfluenciadores, com menos de 10 mil seguidores, a megainfluenciadores, com mais de 1 milhão.

No topo dos megas estão a cirurgiã dermatologista americana Sandra Lee (@drpimplepopper), que vive a espremer espinhas e a dissecar lipomas e cistos, com 4,6 milhões de seguidores; o russo-americano Mike Varshavski (@doctor.mike), médico de família que trata de assuntos variados e já foi perfil da revista People como o “médico mais sexy”, com 4,4 milhões; e o indiano radicado nos EUA Deepak Chopra (@deepakchopra), autor de best-sellers no campo da espiritualidade, com 3 milhões.

No Brasil, o Conselho Federal de Medicina (CFM) se diz ciente da questão. “Estamos vivendo uma epidemia de influencers na área de saúde, e isso é uma coisa à qual precisamos reagir”, afirma Jeancarlo Fernandes Cavalcante, 3.º vice-presidente da entidade.

Uma das reações do CFM seria a Resolução 2336, de 2023, conhecida como Manual da Publicidade Médica, que autoriza o médico a mostrar seu trabalho nas redes sociais, mas com ressalvas. Pode-se divulgar preços de consultas, mas não de procedimentos. É permitido compartilhar elogios sobre a própria atuação feitos em postagens de terceiros ou de pacientes, mas não mais do que 2 por semestre (a repostagem é considerada postagem) e que não sejam sensacionalistas.

Participar de publicidade de medicamento, insumo médico, equipamento, alimento e quaisquer outros produtos que induzam à garantia de resultados, nem pensar. Assim como é vedado ao influencer anunciar que trata de sistemas orgânicos, órgãos ou doenças específicas quando não for especialista. “A maior parte dos influenciadores é generalista”, diz Cavalcante. “Muitas vezes são recém-formados, e é aí que está o maior perigo.”

O conselheiro indica ao usuário, antes de tudo, digitar o nome do médico no portal do CFM ou do respectivo Conselho Regional de atuação e buscar o Registro de Qualificação de Especialista (RQE), conferido a quem fez residência ou obteve o título pela Associação Médica Brasil ei r a (AMB).

“Se o conteúdo do que está falando é legítimo, cientificamente comprovado, o generalista pode fazer publicidade, mas não pode se anunciar como especialista ou anunciar especialidades que não existem”, afirma Cavalcante.

Ciência como base

Com 1,1 milhão de seguidores no Instagram, o cardiologista paulistano Roberto Kalil Filho (@drrobertokalil), de 65 anos, diretor clínico do Instituto do Coração (InCor) e professor titular da Faculdade de Medicina da USP, tem evidentes no seu perfil os dois registros, o CRM e o RQE, como oficialmente requisitado. Mas entende que, para o usuário, o mais importante é passar informação conforme o protocolo das sociedades médicas. “Um conteúdo médico, quando postado, tem de ser extremamente baseado em ciência”, afirma.

Kalil e sua equipe selecionam os temas muito pela curiosidade dos próprios seguidores, mas também quando há pesquisas relevantes, como um estudo do InCor sobre os efeitos nocivos do cigarro eletrônico, divulgado em novembro passado. Kalil entrevistou uma das autoras da pesquisa, nos moldes do que faz no programa Sinais Vitais, da CNN Brasil, também reproduzido em postagens no Instagram. “Meu objetivo é pouco teatro e muita Medicina”, diz. “Tudo é no sentido de informar, e não de tratar o paciente”, esclarece, reiterando que não faz consulta por rede social.

Mais do que informar, o pediatra e sanitarista Daniel Becker quer formar. Carioca de 66 anos, Becker foi o primeiro médico brasileiro a trabalhar com a organização Médicos sem Fronteiras, no limite da Tailândia com o Camboja, e um dos criadores do programa Saúde da Família, do SUS. Nas redes sociais, ele se propõe a falar menos do dia a dia da maternidade e mais de questões graúdas da infância, dentro de um contexto político, social, econômico e ambiental – tanto que sua conta profissional no Instagram é @pediatriaintegralbr. É dos poucos médicos a não usar “Dr.” no perfil. Becker dá palestras e oferece cursos.

A quem deseja seguir médicos nas redes sociais, ele aconselha atenção a pontos como excesso de assertividade, agressividade, autoexibição, masculinidade tóxica, viagens de luxo e verdades absolutas. “Se não há espaço de reflexão, eu já ficaria desconfiado.” (Estadão Conteúdo)

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