Sexta-feira, 10 de janeiro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 3 de novembro de 2024
Depois da descoberta de fraudes no auxílio-doença pago pelo INSS, o alvo do pente-fino que o governo tem passado sobre os gastos sociais agora é o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que paga um salário mínimo mensal a deficientes e idosos de baixa renda. Não é preciso ter contribuído à Previdência para receber o BPC, corrigido pelas mesmas regras generosas do salário mínimo.
Apenas neste ano, o BPC representará uma despesa de R$ 111,5 bilhões, um aumento de 20,3% sobre o gasto de 2023. No primeiro semestre, ele custou R$ 44,1 bilhões, alta de 19,8% em relação ao período em 2023. Os novos benefícios somaram 1,1 milhão nos primeiros seis meses de 2024, 40% acima do verificado no ano passado. Não há fila de espera que justifique o salto.
O governo tem aproveitado a necessidade de cortar gastos, exigida pelas metas fiscais, para jogar luz sobre programas sociais. A rigor, a avaliação da qualidade da despesa pública deveria ser preocupação constante. A atenção não pode acontecer apenas em momentos de aperto financeiro, situação constante num Estado em crise fiscal crônica. Mas evidentemente é preferível investigar e punir os abusos a deixar tudo como está. Já houve estimativas de que seria possível economizar até R$ 6 bilhões anuais com o pente-fino no BPC, embora o governo depois tenha considerado o número exagerado.
Parece, de todo modo, haver uma corrida da população atrás de um dinheiro fácil. A própria ministra do Planejamento, Simone Tebet, disse em junho no Congresso que “o BPC cresceu de tal forma que tem de haver alguma coisa errada aí”. Ela deixou uma pergunta no ar: “Será que algumas pessoas estão indo para a fila do BPC e recebendo indevidamente?”. Para ter ideia da dimensão dos desvios, em agosto começou uma revisão no cadastro do programa e, em apenas uma semana, foi suspenso o pagamento a 400 mil beneficiários que não estavam no Cadastro Único (CadÚnico), que reúne os contemplados pelos programas sociais.
O BPC passará enfim a ter administração semelhante à do Bolsa Família, com o cruzamento mensal dos dados. Como ele é um programa social disfarçado de benefício previdenciário, não havia até agora checagem dos CPFs dos beneficiários com os do CadÚnico. Técnicos do Ministério do Desenvolvimento Social estimam que haja 1 milhão de CPFs no BPC, de um total de 6,1 milhões, com algum tipo de problema. Daqui para a frente, precisarão comprovar que atendem às regras para continuar a receber. Também se pretende exigir, como ocorre com os aposentados pelo INSS, prova de vida anual, além de reconhecimento facial e biometria para concessão do benefício e continuidade dos pagamentos. Nada que já não pudesse estar em vigor.
A ideia do governo é fixar as normas do programa em Projeto de Lei encaminhado ao Congresso. Talvez assim os responsáveis pelo BPC possam fazer uma gestão uniforme e técnica do programa, sob qualquer governo. O maior aumento de gastos com o BPC começou no segundo semestre de 2022, quando houve eleições para presidente. Os programas sociais precisam ser do Estado, sem influência do calendário político-eleitoral. Num país com grandes desníveis de renda e bolsões de pobreza é essencial uma gestão eficiente desses gastos, para que os desvios não deixem desassistidos quem de fato necessita dos recursos. (Opinião/O Globo)