Sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Guerra na Ucrânia: barítono recupera voz após quase ser morto por russos

Foi a apresentação mais importante de seus 29 anos. Não houve trajes especiais, nem palco, nem orquestra. Apenas um pianista solitário debruçado sobre seu instrumento. Como plateia, um grupo de médicos e enfermeiras, que assistiu de um saguão do hospital.

Sergiy Ivanchuk – o rosto cheio de ataduras, as pernas tremendo – começou hesitante. Mas, quando sua voz de barítono profundo conseguiu sustentar as notas, a confiança cresceu. Cantou uma música folclórica ucraniana com a paixão de um homem que voltara dos mortos, que recuperara a voz. “Durante três meses, achei que eu ia morrer. E agora consigo cantar de novo”, disse às pessoas presentes.

Pouco antes, Ivanchuk tinha acreditado que estava no leito de morte, os pulmões perfurados por balas, o corpo preso a um emaranhado de tubos. Em dez de março, Ivanchuk, aspirante a cantor de ópera, trabalhava com voluntários humanitários, ajudando civis a fugir da cidade ucraniana sitiada de Kharkiv, quando as forças russas atacaram e ele foi baleado. Lembrou-se de ter pensado que, mesmo que conseguisse sobreviver, certamente seus dias de cantor tinham acabado.

Mas uma série de casualidades, médicos comprometidos e o amor de sua mãe resultaram nessa apresentação recente e inesperada em um hospital militar alemão, dando a Ivanchuk a chance de transformar uma tragédia em uma oportunidade de salvar seu sonho de ser um astro da ópera.

Em 2020, Ivanchuk estava estudando ópera na Itália e tinha uma grande ambição: apresentar-se no palco do Metropolitan em Nova York e no do La Scala em Milão. Foi quando a pandemia fechou as fronteiras pelo mundo. Sua escola de música interrompeu as atividades, e Ivanchuk voltou para a Ucrânia, onde lutou contra uma depressão severa.

Dois anos depois, quando o mundo começou a reabrir e a invasão russa começou, Ivanchuk se viu preso na Ucrânia mais uma vez: os homens com idade para lutar foram proibidos de deixar o país. Seu sonho estava desaparecendo rapidamente – um cantor de ópera deveria completar seu treinamento aos 30 e poucos anos. Ninguém sabia dizer quando a guerra acabaria.

Perseverança

Era uma rotina dura. Todo dia, às seis da manhã, ele ia a Kharkiv, levando remédios e mantimentos para aqueles que ainda estavam lá. Toda noite, pegava moradores que fugiam do cerco, aqueles que não podiam pagar um táxi. Dormia algumas horas em casa com os pais, e recomeçava.

Sua mãe, Olena Ivanchuk, aguardava seu retorno toda noite em um tormento silencioso. Mas, na manhã de dez de março, ela teve de falar: enquanto limpava a casa, notou que os ícones religiosos da família tinham caído da mesa, o que interpretou como um mau presságio. “Quando eu disse a ele, seu rosto se transformou. Pela primeira vez na minha vida, falei: ‘Meu filho, tenho medo de que desta vez você não volte.’”

Ele foi para Kharkiv mesmo assim. Naquela noite, Ivanchuk e os passageiros entraram em seu Lada com malas e animais de estimação. Estava muito escuro quando saíram da cidade. Através da escuridão, balas passaram zunindo de repente. Em um jogo aterrorizante de gato e rato, Ivanchuk acelerou, tentando encontrar a proteção de um posto de controle militar ucraniano. Mas as forças russas logo atingiram seu alvo: 30 balas acertaram o carro. Cinco atingiram Ivanchuk. “Senti cada uma delas. A primeira acertou uma perna, depois a mesma perna de novo. Então vi meus dedos da mão destruídos. Depois disso, senti uma bala no meu lado e nas costas.”

Compartilhe esta notícia:

Voltar Todas de Você viu?

Ator Alec Baldwin faz acordo com família de fotógrafa morta em filmagem
É seguro clarear os dentes? Nem toda técnica funciona; entenda
Pode te interessar
Baixe o app da TV Pampa App Store Google Play