Quarta-feira, 08 de janeiro de 2025
Por Redação Rádio Pampa | 7 de janeiro de 2025
Embora muitos pais temam os efeitos de uma separação para os filhos, especialistas alertam que a convivência em um ambiente familiar marcado por conflitos pode ser ainda mais prejudicial para as crianças. O número de divórcios no Brasil tem aumentado consideravelmente, e em 2022, o país registrou 420.039 separações, o maior número da história, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Desses, 47% envolviam casais com filhos menores de idade.
A jornalista Deiviane Jhasper compartilhou sua experiência ao decidir pelo fim do relacionamento para proporcionar um ambiente mais saudável e tranquilo para suas filhas. Segundo Deiviane, os problemas no casamento começaram a se intensificar com o passar do tempo, especialmente por questões financeiras.
“Depois do casamento, os conflitos se intensificaram conforme os meses foram passando, principalmente por motivos financeiros. Discutíamos várias vezes e nem sei dizer por quanto tempo. Algumas discussões, infelizmente, as crianças acabaram presenciando. Por isso foi melhor eu ter tomado essa decisão da separação”, relata.
Um dos sinais mais preocupantes foi o impacto emocional em sua filha mais velha, Maria Júlia, de 9 anos, que começou a apresentar crises de nervosismo e choro.
“A Maria Júlia ficava muito nervosa, chorando muito, e inclusive eu a levei ao psicólogo. Mas, graças a Deus, não teve sequelas. Mesmo assim, era algo incontrolável, porque não tinha respeito. Discutíamos muito, e ele era bastante ciumento também”, explica.
Diante desse cenário, Deiviane percebeu que a separação era necessária, não só para seu bem-estar, mas também para a saúde emocional de suas filhas.
“Eu fui vendo que, para mim e para as minhas filhas, o melhor seria a separação. E foi mesmo, porque hoje estamos muito mais em paz. Consigo organizar minha rotina muito melhor, ter mais concentração no que eu preciso e mais foco. A nossa vida é muito mais tranquila”, conta.
Apesar das dificuldades enfrentadas durante a crise no casamento, ela ressalta que o processo de separação foi amigável e trouxe benefícios para todos.
“Apesar de toda a crise, o processo de separação foi muito tranquilo. Ele foi de acordo, foi uma separação amigável. Ele paga a pensão em dia, e hoje estamos em paz. Ele vive a vida dele, eu vivo a minha, e cada um segue o seu dia a dia, correndo atrás para proporcionar tudo de bom para as nossas filhas”, afirma.
Mesmo não sendo pai biológico de Maria Júlia, o ex-companheiro mantém o carinho e a responsabilidade construídos durante a convivência.
“Eu falo ‘nossas filhas’ porque a Maria Júlia, apesar de não ser filha dele, ele também fez parte dessa convivência.”
O impacto de viver em um ambiente conflituoso
A psicóloga Bárbara Couto, mestre em psicologia clínica e saúde, explica que, quando há constante hostilidade em casa, o melhor para os filhos pode ser a separação dos pais. Segundo ela, os efeitos de viver em um ambiente repleto de discussões, brigas e tensões são devastadores para o desenvolvimento emocional das crianças. “A exposição prolongada ao estresse, com altos níveis de cortisol, prejudica o desenvolvimento do cérebro das crianças, afetando áreas como o hipocampo e o córtex pré-frontal, responsáveis pela memória e regulação emocional”, explica a psicóloga.
Ela explica que esse ambiente gerado por constantes conflitos prejudica diretamente o bem-estar das crianças. “É mais saudável para as crianças que os pais se separem, oferecendo a elas dois lares saudáveis e estruturados, do que continuar em uma casa onde o estresse é constante”, orienta.
O impacto do distanciamento dos pais
Mesmo quando os filhos não presenciam brigas, eles são capazes de perceber mudanças no relacionamento dos pais. A psicóloga enfatiza que as crianças são altamente sensíveis e captam sinais de desarmonia, como silêncios tensos e distanciamento emocional ou físico entre os pais. “O comportamento de uma criança pode ser um reflexo do que acontece no ambiente familiar, mesmo quando ela não tem capacidade de verbalizar o que está acontecendo”, diz Bárbara. Como resultado, as crianças podem desenvolver problemas como ansiedade, dificuldades no sono, e mudanças no comportamento, como regressão ou agressividade.
Além disso, quando as crianças testemunham abusos emocionais, seja em relação à mãe ou ao pai, há o risco de internalizarem esses padrões, repetindo-os em seus próprios relacionamentos ou desenvolvendo dificuldades em se relacionar de forma saudável. A psicóloga também alerta para as consequências de ter autoestima baixa e dificuldades em expressar emoções. “O impacto do abuso psicológico observado pelos filhos tem repercussões no seu desenvolvimento emocional e neurológico, influenciando suas habilidades sociais e cognitivas”, completa.
O exemplo dos pais: um reflexo nos filhos
A psicóloga também destaca que os pais são os primeiros modelos de comportamento para seus filhos. Quando as crianças crescem observando um relacionamento marcado por brigas e desrespeito, elas tendem a considerar esse comportamento como algo normal. “O que essas crianças aprendem em casa acaba sendo repetido em suas próprias vidas, perpetuando padrões de relacionamentos tóxicos e dificultando a formação de vínculos saudáveis no futuro”, afirma Bárbara.
Outro ponto ressaltado por ela é que, muitas vezes, os pais que continuam em um casamento conflituoso acabam projetando nos filhos a responsabilidade pela manutenção da relação, o que pode gerar sentimentos de culpa nas crianças. “Embora o gesto pareça ser altruísta, essa decisão de manter o casamento pode causar danos irreparáveis tanto para os pais quanto para os filhos”, conclui a psicóloga.
Os danos emocionais a longo prazo
O impacto de viver em um ambiente familiar desestruturado não se limita à infância. Crianças que vivenciam conflitos constantes podem carregar essas experiências para a vida adulta, dificultando a construção de relacionamentos saudáveis e equilibrados. Estudos demonstram que a exposição ao estresse na infância pode aumentar a probabilidade de a pessoa desenvolver distúrbios psicológicos, como ansiedade e depressão, além de comprometer a habilidade de lidar com emoções e tomar decisões em situações de conflito. Essas crianças têm mais chances de reproduzir, em sua vida adulta, os padrões de relacionamentos disfuncionais que presenciaram em seus pais.
O bem-estar infantil
Portanto, se a separação dos pais for uma decisão inevitável, o mais importante é garantir que os filhos tenham acesso a um ambiente calmo e saudável, seja nos dois lares, ou em um ambiente único, mas com menos conflitos. Garantir o bem-estar emocional das crianças, mesmo diante da separação dos pais, deve ser uma prioridade. A psicóloga enfatiza que um lar sem brigas e sem abusos emocionais oferece a chance para que as crianças cresçam mais equilibradas emocionalmente e com uma maior capacidade de lidar com os desafios da vida.