Sexta-feira, 27 de dezembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 7 de novembro de 2024
O jejum intermitente, prática que envolve permanecer longos períodos por dia sem se alimentar, tem sido alvo de diversos estudos. Muitos trabalhos, em animais, apontam benefícios, como maior longevidade e proteção contra doenças. Mas um novo, publicado na revista científica Nature, sugere a possibilidade de um risco aumentado para tumores no intestino em determinados casos.
O estudo foi conduzido por pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos. Entre eles, o brasileiro Renan Oliveira Corrêa. O trabalho analisou as alterações das células intestinais de camundongos em dois momentos: durante o jejum e na realimentação posterior. Eles observaram que, nesse segundo momento, há uma proliferação intensa de células-tronco intestinais.
Isso, em si, é positivo, e pode até estar por trás dos benefícios associados à dieta por promover uma regeneração. No entanto, os cientistas perceberam que essa disseminação acelerada das células-tronco também aumentou o risco de formação de tumores no local quando em contato com uma mutação. Para os responsáveis pela investigação, os resultados não devem ser lidos como um alerta geral, mas sim como uma cautela para indivíduos com maior predisposição à doença.
“Verificamos no nosso estudo que, por aumentar a proliferação de células-tronco no intestino, dependendo da predisposição genética e, possivelmente, do que se come após o jejum, pode ocorrer um aumento do risco de desenvolvimento de tumores só pelo fato de se fazer jejum”, disse Corrêa à Agência Fapesp.
Ele enfatizou que os achados não significam que o jejum intermitente causa diretamente câncer no intestino, até porque o trabalho foi feito com animais. Mas os cientistas consideram que jejum intermitente deveria ser avaliado com mais atenção por pessoas com histórico familiar da doença, por exemplo.
Além disso, afirmam ser importante atentar-se ao que comer imediatamente após o período do jejum: alimentos cancerígenos, como carnes processadas e álcool, devem ser evitados. É o que destacou Omer Yilmaz, professor de Biologia do MIT e autor do novo estudo, em comunicado sobre a pesquisa:
“Quero enfatizar que tudo isso foi feito em camundongos, usando mutações de câncer muito bem definidas. Em humanos, será um estado muito mais complexo. Mas isso nos leva à seguinte noção: O jejum é muito saudável, mas se você tiver azar e, ao se alimentar novamente depois de um jejum, for exposto a um mutagênico, como um bife carbonizado ou algo assim, você pode realmente estar aumentando suas chances de desenvolver uma lesão que pode dar origem ao câncer.”
Os cientistas explicam que o tecido que reveste o intestino internamente, o epitélio, se renova de três a cinco dias, em média. Esse processo envolve células-tronco, que se multiplicam e se transformam nas células que compõem o tecido. Estudos têm apontado que fatores interferem nesse processo, como o maior consumo de fibras.
No novo estudo, os pesquisadores acompanharam três grupos de camundongos – um que jejuou por 24 horas, outro que jejuou por 24 horas e depois teve permissão para comer o que quisesse pelas próximas 24 horas, e um terceiro que foi um grupo de controle que comeu o que quisesse durante todo o experimento, sem praticar o jejum.
Os resultados mostraram que a regeneração das células-tronco é suprimida durante o jejum, mas depois aumenta de forma significativa durante o período de realimentação, explicou o pesquisador de pós-doutorado no MIT que participou do trabalho Shinya Imada:
“No estado de jejum, a capacidade das células de usar lipídios e ácidos graxos como fonte de energia permite que elas sobrevivam quando os nutrientes estão baixos. E é o estado de realimentação pós-jejum que realmente impulsiona a regeneração. Quando os nutrientes se tornam disponíveis, essas células-tronco e células progenitoras ativam programas que permitem que elas criem massa celular e repovoem o revestimento intestinal.”
Segundo Corrêa, descobriu-se também que isso ocorre devido a uma via celular denominada mTORC – associada ao metabolismo celular e à síntese de proteínas. Porém, nesse período, quando mutações genéticas foram ativadas, os animais tiveram maior probabilidade de desenvolver tumores na região.
“O jejum intermitente pode ser muito eficiente, pois de fato reduz o consumo de calorias. Algumas pesquisas mostraram que, além de favorecer a perda de peso, a prática reduz o risco de diabetes e pode trazer melhorias ao sistema imune, protegendo o organismo contra alguns tipos de câncer. No entanto, identificamos que ele não deve ser indicado para todo mundo, já que o momento de realimentação é de grande proliferação celular e pode tornar as células mais suscetíveis à formação de tumores”, complementa Corrêa.