Domingo, 19 de janeiro de 2025

Lula vive incertezas na relação com Donald Trump; proximidade de líder norte-americano com Bolsonaro pode ser complicador

Após dois anos com uma agenda de interesses comuns com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva vive momento de incerteza sobre as relações com Donald Trump, que voltará à Casa Branca a partir desta segunda-feira (20). Desde que assumiu o terceiro mandato, Lula coopera com os norte-americanos nas áreas de combate ao aquecimento global, transição energética e condições de trabalho. Essas frentes, contudo, são algumas das plataformas mais criticadas pelo republicano.

Há um esforço da diplomacia brasileira para que a convivência entre os presidentes dos dois maiores países das Américas se fortaleça, especialmente sob o ponto de vista econômico. Em meio à troca de comando nos EUA, o Brasil ainda tem como desafio manter o equilíbrio ao se relacionar com os países ocidentais e o Brics, grupo que vai presidir ao longo de 2025. Nesse grupo está, por exemplo, a China, foco de tensão com Trump.

No caso específico da relação bilateral, empresários do Brasil e dos EUA defendem a expansão do comércio e dos investimentos, o que é considerado um ponto a favor de Lula. No entanto, há receio no governo de que projetos de interesse do governo petista sejam prejudicados, devido à proximidade de Trump com os bolsonaristas. Além disso, o americano talvez não perdoe o presidente do Brasil por ter torcido pela vitória da democrata Kamala Harris.

Na esfera diplomática, existe a avaliação de que a América Latina nunca foi prioridade para os EUA. Trump estaria mais preocupado com temas pontuais na região, como imigração, narcotráfico, Venezuela, Cuba e Nicarágua. O Brasil teria muito mais a oferecer, além de ter como ponto positivo a neutralidade, o que lhe garante o cacife para conversar com todos os países, “amigos ou inimigos” de Washington, segundo avaliação do Itamaraty.

Agro e manufatura

Guilherme Casarões, cientista político, professor da Fundação Getúlio Vargas e coordenador do Observatório da Extrema Direita, avalia que três grandes efeitos poderão ser observados a partir do retorno de Trump à Casa Branca. Um deles é o econômico, com potencial de prejudicar as exportações brasileiras de produtos agrícolas e manufaturados e os investimentos que vêm para o Brasil.

O segundo grande efeito deverá se dar na política regional, com uma nova abordagem dos EUA sobre a questão venezuelana e, sobretudo, numa provável aliança entre Trump e o presidente da Argentina, Javier Milei, com potenciais destrutivos sobre o Mercosul. Com a indicação de Marco Rubio — filho de imigrantes cubanos e crítico de Lula — como secretário de Estado, esse cenário se torna mais provável.

O cientista político também cita o efeito na política doméstica, causado pelo fortalecimento do bolsonarismo e em possíveis pressões políticas e sanções contra autoridades brasileiras, para assegurar a reversão da inelegibilidade de Jair Bolsonaro.

O acadêmico destaca que Lula confia na sua boa relação com o também republicano e ex-presidente George W. Bush, como indício de que poderá desenvolver uma relação pragmática com Trump. Mas o novo governo dos EUA, todavia, não é simpático ao Brasil e provavelmente o tratará como adversário, tanto na agenda multilateral quanto nas relações entre China e América Latina.

Tarifas de importação

Para Flavia Loss, coordenadora da pós-graduação em Política e Relações Internacionais da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), o primeiro ponto que afetará o Brasil é o aumento de tarifas de importação pelos EUA, com ênfase para Canadá, México e China. Essa é uma das mais importantes promessas de campanha de Trump e está tirando o sono do resto do mundo.

“Trump está prometendo aumentar as tarifas em 25% para importações do México e Canadá e em 10% produtos chineses. Mas, partindo do histórico do seu primeiro mandato, sabemos que ele costuma aumentar as tarifas para todos os produtos estrangeiros, e isso impactará as exportações da indústria brasileira”, disse Loss.

Pragmatismo

Abrão Neto, CEO da Amcham Brasil — a maior câmara americana de comércio fora dos Estados Unidos — acredita que as relações entre Brasil e EUA vão se pautar pelo pragmatismo. Do ponto de vista empresarial, há uma agenda sólida entre os dois países, o que incentiva uma convivência respeitosa e construtiva entre Lula e Trump.

Neto ressalta que o aumento do protecionismo e de medidas restritivas e unilaterais é uma realidade. Mas afirma que o Brasil tem ativos importantes para enfrentar essa fase e levar em frente uma relação entre Estados, e não entre governos.

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