Sexta-feira, 27 de dezembro de 2024

Mais uma década perdida

O tempo voa, dizem aqueles angustiados com a velocidade com que escorrem os dias… E o tempo é implacável também, concluem os mais pragmáticos, ao observarem projetos sucumbir por falta de tempestivas diligências. Se é assim para os indivíduos, por que seria diferente para organizações maiores, como governos, por exemplo? Nessa perspectiva, há sobradas razões para inquietações quando observamos o quadro de estagnação a que foi submetido o Brasil nas últimas décadas. Depois de ostentar a condição de economia com um dos maiores crescimentos do PIB no mundo, entre 1930 e 1980, nosso País mergulhou em crises sucessivas, o que não apenas interrompeu um longo círculo virtuoso de quase meio século de expansão da economia, como viu crescer de maneira assustadora os níveis de pobreza, o aumento da desigualdade social e a violência. Criar condições para fugir desse sistema perverso de baixo crescimento, miséria e instabilidade econômica exigirá muito mais do que somente bons propósitos, mas uma dose extra de mobilização social e política no sentido de reformas que, embora flagrantemente inadiáveis, estão sendo sistemática e dolorosamente postergadas.

 

Durante o período de 1930 a 1980, o Brasil passou por diversas transformações políticas e econômicas que impulsionaram o seu crescimento econômico. A rápida industrialização do País, conjugada com o aumento da urbanização, investimentos em infraestrutura, aumento da produtividade agrícola e políticas sociais consistentes, deram o formato de uma economia moderna que faltava ao Brasil, até então eminentemente rural, subdesenvolvido e subletrado. Já a partir da década de 1980, os problemas que acometeram a economia brasileira se tornaram recorrentes, com uma sucessão de momentos de instabilidade econômica e política, incluindo hiperinflação, crises cambiais, impeachment de presidentes, todos eventos que afetaram a confiança de investidores e o desempenho da economia. Esse ambiente tumultuado passou a comprometer a capacidade do Governo em investir em obras de infraestrutura, afetando a produtividade de vários setores. A falta de investimentos em rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e telecomunicações, por exemplo, limitou a capacidade de expansão de muitos segmentos econômicos. Além disso, a alta carga tributária, a desigualdade social crescente e o aumento da dependência das exportações de commodities impediram ciclos duradouros de desenvolvimento.

 

Hoje, herdeiros desse passado nem tão recente de dificuldades crônicas para encaminhar as grandes questões nacionais, o País se depara com um quadro que sugere um risco não desprezível de “estagflação”, com inflação renitente e baixo crescimento econômico. Embora sequelado por governos ineptos, o Brasil não deveria sequer cogitar sofrer os danos de mais uma década perdida. Entretanto, a continuar nossa incapacidade de bem equalizar questões estratégicas e urgentes, tais como as reformas administrativa, tributária e política, sem contar com a necessidade de retomada dos investimentos públicos em obras de infraestrutura, nosso destino não parece promissor. Para tornar o quadro mais complexo, o atual governo tem insistido em pautas que já deveriam estar superadas, até porque já foram aprovadas pelo Congresso, como a privatização da Eletrobrás, a autonomia do Bacen e a reforma trabalhista.

 

Por fim, e não menos importante, encontra-se a questão política, hoje contaminada seriamente por um antagonismo destrutivo que dificulta o diálogo e pode inviabilizar avanços necessários e que dependem de um mínimo de ambiente colaborativo. Contudo, no momento, ambos os lados extremados enxergam o seu oponente como o “fundo do poço”, negam o direito de existência do outro e não dão sinais de trégua ao atual embate. Enquanto essa visão sectária governar as vontades de eleitores e parlamentares, pouco avançaremos, havendo o risco de vermos mais uma década passar sem que tenhamos uma perspectiva de retomada do pleno desenvolvimento de nossa economia.

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