Sexta-feira, 27 de dezembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 24 de junho de 2024
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado está discutindo a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022, que permite a transferência de terrenos da União à beira-mar, os chamados terrenos de marinha, aos seus ocupantes particulares, mediante pagamento. A transferência de áreas ocupadas por Estados e municípios será gratuita.
Ainda que não trate especificamente da privatização de praias, o texto provocou polêmica, pois, segundo especialistas, caso seja aprovado, permite que sejam criadas barreiras no acesso à faixa de areia – com a construção de empreendimentos turísticos e imobiliários.
Para entrar em vigor, a PEC precisa ser aprovada em votação no Senado, ainda sem data definida. Ambientalistas afirmam que o texto dá margem para a criação de praias privadas, além de promover riscos para a biodiversidade e para as comunidades tradicionais de pescadores e caiçaras. Hoje, partes de áreas urbanas de grandes cidades litorâneas, como Rio de Janeiro, Fortaleza, Florianópolis e Santos estão dentro da faixa de marinha.
O relator da PEC, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), já se posicionou favorável ao projeto que, segundo ele, vai atingir 521 mil propriedades cadastradas pela Secretaria de Patrimônio da União (SPU). Ele diz que a proposta pode facilitar o registro fundiário e também gerar empregos. Os defensores da PEC negam haver qualquer margem para privatização por meio do texto da nova regra.
A proposta foi aprovada pela Câmara em fevereiro de 2022. Conforme o projeto, os proprietários pagariam pelos 17% que pertencem à União em um prazo de até dois anos.
Segundo Ronaldo Christofoletti, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a aprovação da proposta pode acelerar ainda mais a ocupação das faixas litorâneas. “Prédios e condomínios foram construídos quase dentro da água, com retirada de restinga e manguezais que protegem a faixa de areia. O desprovimento das áreas de marinha levará a uma maior ocupação dessas áreas no momento em que as mudanças climáticas tornam as grandes ressacas mais frequentes”, diz.
Atualmente, a lei prevê que, no Brasil, embora os ocupantes legais tenham a posse e documentos do imóvel, as áreas litorâneas, inclusive as praias, pertencem à União e não podem ser fechadas, ou seja, qualquer cidadão tem o direito de acesso ao mar. Com a extinção do terreno de marinha, o proprietário passaria a ser o único dono, podendo transformar a praia em espaço particular.
Em outros países, existem diferentes modelos de utilização da praia pelo setor privado. Conheça alguns deles:
Itália
O turismo à beira mar é um dos principais setores da economia italiana. Embora sejam consideradas bens públicos, boa parte das praias do país é ocupada por estabelecimentos balneares por meio de concessões do governo – cerca de 40%, segundo relatório de 2020 da entidade ambientalista Legambiente.
A concessão permite que o setor privado explore comercialmente as áreas, com a cobrança de ingresso e oferta de serviços como alimentação, além de itens como espreguiçadeiras e guarda-sol. O acesso à faixa de cinco metros mais rente ao oceano, porém, deve ser livre e gratuito.
França
A rigor, não existem praias particulares na França, uma vez que a lei garante acesso público e gratuito a essas áreas. O Estado pode, no entanto, oferecer concessões de uso para empresas privadas mediante o pagamento de uma determinada taxa. Geralmente são hotéis, restaurantes ou clubes que reservam parte da faixa de areia da praia para seus frequentadores.
Estados Unidos
Embora a legislação estabeleça que todas as praias dos Estados Unidos devem ter algum trecho reservado para o uso coletivo gratuito, a divisão entre o público e o privado varia de um Estado americano para outro.
Normalmente, o controle dos proprietários de imóveis e terrenos à beira-mar é delimitado pela linha da maré alta, mas em alguns casos se estende até o limite da maré baixa. Há Estados em que o trecho seco da praia fica inacessível para visitantes.
México
Não existem praias privadas no México, mas o governo permite a concessão de trechos da faixa de areia para o desenvolvimento de atividades econômicas, também por meio do pagamento de taxa. A área é delimitada em 20 metros a partir da maré alta.
As licenças têm duração máxima de 20 anos e permitem a prestação de serviços turísticos diversos, inclusive com a instalação de infraestrutura – por exemplo, quiosques. A legislação proíbe que os titulares da concessão impeçam a circulação de pessoas na praia ou que exijam consumo de itens dos estabelecimentos para acessar a área.