Sexta-feira, 27 de dezembro de 2024

Saiba os riscos dos “chips da beleza”, suspensos pela Anvisa após aumento de queixas

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou que publicará no Diário Oficial da União (DOU) uma resolução suspendendo a manipulação, a comercialização, a propaganda e o uso dos implantes hormonais manipulados, conhecidos como “chips da beleza”. A medida foi adotada após denúncias apresentadas por entidades médicas, entre elas a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), que apontam um crescimento do atendimento de pacientes com problemas devido ao uso desses dispositivos.

Os implantes, feitos em farmácia de manipulação, misturam diversos hormônios, inclusive de substâncias que não possuem avaliação de segurança para essa forma de uso. Embora relatos sobre seu uso sejam comuns nas redes sociais, os chips da beleza não são aprovados pela Anvisa nem podem ser indicados pelos médicos para fins de ganho de massa muscular ou performance, segundo regras do Conselho Federal de Medicina (CFM).

O principal motivo para isso é a segurança. Esses implantes podem levar a uma série de riscos, desde alterações comportamentais até aumento do risco de doenças cardíacas, como infarto e acidente vascular cerebral (AVC). No início do ano, o caso de uma jovem de cerca de 20 anos que foi internada em estado grave, em São Paulo, depois de sofrer um edema cerebral viralizou nas redes sociais. A paciente não tinha doenças prévias, e o problema aconteceu menos de um dia depois de ela ter colocado um “chip da beleza”.

Esses implantes podem conter uma série de hormônios, sem que o usuário saiba qual exatamente está presente ali. Um muito utilizado é a gestrinona, uma forma sintética da testosterona, ou seja, que faz parte da classe de esteroides androgênicos e anabolizantes (EAA) — que foram alvo do CFM em abril.

“Nós estamos observando no Brasil um aumento exponencial da prescrição de esteroides androgênicos e anabolizantes para fins estéticos, de ganho de massa muscular e de melhoria de desempenho esportivo, inclusive entre mulheres. Os especialistas foram unânimes em afirmar que os benefícios da utilização dessas medicações para esses fins não superam os riscos. Não existe dose mínima segura, como alguns usuários alegam. Por isso, estamos proibindo essa prática”, afirmou José Hiran Gallo, presidente do CFM na época em que o órgão vetou a indicação de produtos do tipo para fins estéticos ou de performance.

Os esteroides anabolizantes são necessários somente em casos em que de fato há a necessidade e indicação médica adequada, explicou o presidente do Departamento de Endocrinologia do Exercício e do Esporte da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Clayton Macedo:

“Elas são utilizadas para indivíduos que têm deficiência da testosterona, como homens com hipogonadismo, ou para incongruência de gênero, no caso de hormonoterapia para homens trans. Essas são as duas grandes indicações hoje, para quem tem falta do hormônio, mas isso precisa ser comprovado e impactar o quadro clínico.”

Apesar do alerta de especialistas para que o uso dos EAA seja feito apenas nos casos indicados, a busca por “chips da beleza”, “bombas”, oxandrolona e outros anabolizantes com fins estéticos tem se tornado, inclusive, a maioria das prescrições de substâncias do tipo, apontou Marcelo Bichels Leitão, cardiologista e diretor científico da Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte (SBME).

“O mercado cresceu muito. Existem muitos médicos que fazem prescrições inapropriadas, e existe um mercado clandestino muito grande, nas próprias academias, na internet, você vê pessoas vendendo e uma facilidade muito grande no acesso. E os impactos, sejam estéticos ou de ganho de performance, são transitórios e levam a uma série de efeitos colaterais graves”, diz o especialista.

As consequências das substâncias estendem-se a diversos mecanismos diferentes do corpo humano, desde uma masculinização indesejável entre as mulheres, até maior risco para problemas cardíacos e infertilidade entre os homens. Além disso, há os impactos psíquicos, que podem levar a alterações bruscas de comportamento.

“O hormônio é o da fuga, da força, então pode aumentar a agressividade dos indivíduos, e inclusive a probabilidade de tomar uma atitude criminosa. Nosso cérebro é rico em receptores da testosterona, e isso altera o comportamento, dá um grau de irritabilidade. Existe um trabalho dinamarquês que acompanhou durante 12 anos usuários de esteroides e, no final, mais de 20% tinham sido presos por algum crime não relacionado a fatores socioeconômicos”, disse o especialista da SBEM.

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