Quarta-feira, 20 de novembro de 2024

Sim, elas existem

Este é um texto para quem é mãe. E para quem já foi. E para quem não é, nunca será e nem quer ser. Mas a conclusão, eu já adianto: a vida é complexa, mas, com filhos, essa realidade ganha contornos exponenciais.

Era uma terça-feira relativamente comum, com a diferença de que eu não compareceria à bancada do Atualidades Pampa em função de um evento beneficente ao qual eu fazia questão de comparecer. O dia, contudo, seria corrido, e eu teria uma janela de 45 minutos entre chegar em casa já pronta (isto é, escovada e maquiada, o que poupa muito tempo) para tomar banho (tipo “banho de gato” mesmo) e me vestir. Ou melhor, DECIDIR o que vestir, o que leva muito mais tempo. Primordialmente, contudo, eu queria dar um beijo nos meus guris. Eu sinto muito necessidade de estar presente na rotina, mas a verdade é que estou fora de casa, diariamente, em um horário crucial: é entre às 18h30 e 21h que se toma banho, se janta, se conversa, se organiza o dia seguinte, se acalma. É uma escolha diária não estar presente. Portanto, nesse dia em que eu sairia uma hora mais tarde, eu queria ESTAR.

E estive. E estaria tudo certo, não fosse um contratempo básico: os filhos. E aí, meu bem, não há agenda que seja garantida… Invadi a casa com um pontapé, roupas da lavanderia, sacolas de super e copos Stanley para café que se acumulam no carro, jogando os itens para um lado e já entrando no banho quando, claro… inicia um drama doméstico. E é DRAMA com letras maiúsculas, pois sou uma virginiana com dois filhos cancerianos. Entendedores entenderão…

Pouparei os envolvidos e manterei o anonimato, porque o que importa é a conclusão: nos minutos que eu tinha para agir, já devidamente produzida, eu precisei, efetivamente, resolver questões sérias, que incluíram a minha entrada no chuveiro com meia-calça e botas (não pense bobagem, não foi sexy), corrida pela casa por toalhas secas, preparação de frango com ovo e, claro, o resgate da televisão nova na portaria. Isso tudo depois de passar alguns minutos assessorando o banho em meio ao vapor (que acabou com a minha escova, aliás). Em quarenta e cinco minutos, cansei mais do que no dia inteiro. E ISSO é assustador.

A rotina da mulher moderna é insana. O que posso dizer, pela minha geração, é que fomos criadas para cuidar de nós mesmas, trabalhar, ganhar nosso dinheiro, viver nossos sonhos. Lindo. Porém, esqueceram de excluir dessa equação a cobrança da sociedade em ter diploma universitário, casar, ter filhos e ser, enfim, uma mulher linda. E magra.

E, vejam, eu não fiz nada demais. Eu só resolvi uma treta doméstica. Uma não. Várias. E a questão não é essa. A questão é que a vida em família é como uma empresa que não gera lucro, nem remunera o CEO: precisa funcionar, tem o foco no desempenho, exige lealdade absoluta, depende de entrega emocional, é a base da operação inteira, mas… não remunera ninguém!

Sou do time de mulheres que acumula funções e optou por se dividir em mil, a fim de concretizar seus sonhos: sempre quis ser mãe, sempre quis passar o sábado de noite em frente à lareira com a minha família, mas também sempre quis alçar voos próprios. A minha carreira. O meu propósito.

A questão é que há inúmeras, milhares de mulheres que, seja por opção ou seja por necessidade, precisam encarar isso tudo sem a chance de sequer olhar “de revesgueio” para os próprios sonhos, Mulheres que encaram turnos. Mulheres que não contam com rede de apoio. Mulheres que, simplesmente, não conseguem espaço para criar a oportunidade de seguir. Somos seres únicos – e individuais, também. Abrimos mão de nós mesmos pela gratificação do aplauso do público, muito embora a resposta (e a glória) esteja dentro de nós.

O ponto aqui é simples: desde as mais singelas tarefas diárias às mais complexas questões sociais, a vida é bem mais difícil para as mulheres. É preciso superar imposições culturalmente enraizadas, enfrentar obstáculos constantes de descrédito e desmerecimento, provar a capacidade de forma muito mais ostensiva e contínua e, por fim, parecer forte.

Ser mulher ainda não é fácil – e não o será enquanto não houver uma clara compreensão dos papéis sociais – e de como a mulher pode, sim, abrir mão de ser a protagonista como mãe em prol de outros interesses. Porque eles existem. Afinal, antes de nos entregarmos a todos os rótulos que a sociedade nos impõe, somos apenas mulheres. Mulheres com sonhos. E isso é de um poder imenso.

Saiam das sombras e tomem seus postos sem medo.

Sejamos mães (às que assim o quiserem), mas sejamos, antes de mais nada, apenas mulheres. Mulheres com sonhos. Sonhos imensos e muita vontade. E que se dê tempo a cada uma de nós para lidar com esses sonhos, a fim de que possamos, também, gerenciar com a rotina doméstica. E que se apoie. E que se aplauda. Porque ter sucesso não é fácil. Mas ter sucesso, sendo mãe… é coisa de super herói. E, sim, eles existem. Ou melhor, elas, as super heroínas.

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