Segunda-feira, 23 de dezembro de 2024
Por Redação Rádio Pampa | 5 de dezembro de 2024
A incorporação do novo medicamento preventivo contra HIV cabotegravir no Sistema Único de Saúde (SUS)e já está em negociação envolvendo governo, médicos e laboratório. O fármaco de uso PrEP (profilaxia pré-exposição) é aquele capaz de impedir a infecção pelo vírus com injeções bimestrais.
A Anvisa já aprovou o medicamento no País em abril. A Fiocruz deve finalizar em breve o estudo de implementação que avalia a possibilidade de adoção pelo SUS, do ponto de vista técnico. Uma vez finalizado, no caso de resultado recomendando a adoção, o documento é submetido ao órgão de governo que avalia o custo-benefício da incorporação do produto.
Quem faz a avaliação do ponto de vista mais financeiro é a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec), subordinada ao Ministério da Saúde.
Antes de mesmo de ser anunciado oficialmente o resultado da avaliação da Fiocruz, o medicamento produzido pela multinacional farmacêutica GSK em parceria com o laboratório ViiV Healthcare, já é alvo de entusiasmo por parte de médicos.
“Assim que a gente tiver os resultados, e a gente já viu de forma preliminar os resultados, isso vai ser encaminhado para a Conitec”, afirmou na semana passada o médico Alexandre Naime, coordenador científico da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), no lançamento de uma campanha informativa contra o HIV.
Boa parte da empolgação que os cientistas deixam extravasar com o cabotegravir é que o medicamento representou um grande ganho contra a taxa de infecção em países da África onde questões culturais, como rejeição ao preservativo, ainda atrapalham as políticas contra a epidemia do vírus.
A expectativa é que a incorporação da PrEP injetável no sistema de saúde tenha um bom custo-benefício, porque investimentos em prevenção em geral se compensam mais adiante, evitando despesas com terapia antirretroviral e acompanhamento para quem já é soropositivo.
Hora da pressão
Respondendo a uma plateia de ativistas de defesa de diretos dos pacientes, Naime os convidou a defender a adoção do novo medicamento no SUS na próxima etapa, na Conitec.
“É aí que chega o momento da pressão. Toda a sociedade organizada, cientistas, médicos, influencers e ONGs têm que fazer a pressão pela aprovação, considerando que as estratégias de prevenção tem que ser individualizadas.”
Como cada tipo de população tem uma cultura de prática de sexo diferente, os médicos defendem o cabotegravir não como uma panaceia geral para derrotar o vírus, mas como uma ferramenta entre muitas que é preciso ter em um arsenal.
O estudo da Fiocruz foi especificamente desenhado para avaliar a eficácia de prevenção do novo medicamento em um recorte populacional de “homens jovens HSH (homens que fazem sexo com homens), não-binários, travestis e pessoas transexuais”.
Cientistas que a eventual inclusão do remédio no SUS com acesso gratuito pode ajudar muito uma outra população particularmente vulnerável que é a de trabalhadoras e trabalhadores do sexo. Com aplicação bimestral, mesmo por via injetável, a expectativa é que a adesão ao cabotegravir possa ser maior que ao Truvada, medicamento PrEP oral contra o HIV.
A divisão brasileira da GSK afirma que, mesmo com avaliação ainda pendente da Conitec, o governo já está em contato com a empresa para acelerar uma eventual negociação.
“A GSK/ViiV Healthcare vem tendo interações com o Ministério da Saúde ao longo de 2024 para trazer o maior nível de celeridade possível à incorporação de Cabotegravir no SUS. Observa-se, por meio de reuniões públicas, que o Ministério da Saúde tem abordado o tema, entretanto sem prazo definido para sua incorporação”, disse a empresa em comunicado.
A companhia afirma que, para acomodar a demanda por preços menores está disposta a licenciar a droga para produção em território brasileiro.
“A empresa está disposta a transferir a tecnologia de produção do Cabotegravir para um laboratório público nos moldes preconizados e defendidos pelo Governo Federal na sua nova política de redução de vulnerabilidade do SUS”, diz a nota. “Enquanto o produto não estiver disponível no SUS, que é nosso objetivo prioritário, estamos buscando alternativas para disponibilizar o Cabotegravir no mercado privado.”
O infectologista José Valdez Madruga, do Centro de Referência em Treinamento para DST/AIDS de São Paulo, acredita que a sociedade civil precisará barganhar ainda um pouco mais para obter sucesso.
“Precisamos pressionar o governo e precisamos pressionar a industria farmacêutica por melhores preços”, afirmou.
Beatriz Grinsztejn, que coordena o estudo de implementação na Fiocruz, diz que já tem na mira das pesquisas da entidade também um outro medicamento, o lenacapavir, ainda em análise na Anvisa. Trata-se de uma injeção de PrEP como o cabotegravir, mas de aplicação semestral, não bimestral, o que facilita ainda mais a adesão.
“Nós fizemos isso com a PrEP oral, estamos fazendo hoje com o cabotegravir e vamos ver se podemos fazer também com o lenacapavir, para avaliar como é que essa droga pode ou não vir a fazer parte do SUS”, afirmou a pesquisadora em entrevista a uma revista de divulgação da própria Fiocruz.