Segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

Veja como fica a relação de Trump com a América Latina

O segundo mandato de Donald Trump deve reposicionar a América Latina e o Caribe no mapa das prioridades do governo dos Estados Unidos. Há temas-chaves para acompanhar, ainda que exista ampla incerteza sobre quais serão os seus desdobramentos.

Durante o primeiro mandato trumpista, a América Latina não era prioridade na agenda dos EUA, mas um olhar para o pessoal com que ele agora se cercou sugere que as coisas poderão ser diferentes. É uma equipe diversa, que oscila entre o ideológico e o pragmático, entre o punitivismo contra autocratas e o transacionalismo em favor dos negócios.

“Acho que isso é uma coisa boa. Por um lado, há o secretário de Estado Marco Rubio, que é cubano de nascimento e muito a favor de sanções contra governos autocráticos de esquerda: Cuba, Nicarágua, Venezuela. Há também Mauricio Claver-Carone, arquiteto da estratégia de ‘pressão máxima’ em relação à Venezuela no primeiro mandato de Trump.”

“Por outro lado, há Richard Grenell como enviado Especial para a Venezuela, que conduziu negociações diretas com Nicolás Maduro e está em contato com muitos investidores e empresários, uma pessoa que é contra sanções”, lista Chris Sabatini, pesquisador-chefe para América Latina do think tank Chatham House.

Ter um secretário de Estado hispânico com tantos vínculos com vários países da América Latina é algo inédito, mas as crises internacionais se multiplicam, e isso pode relegar novamente a região a um segundo plano.

“Reconheço que o coração de Marco Rubio está na América Latina, mas deve ter cuidado para não lhe prestar atenção demasiada, já que ele é o diplomata mais importante do país e terá que lidar com questões globais extremamente complexas”, adverte Michael Shifter, professor do Centro de Estudos Latino-Americanos de Georgetown e ex-presidente do think tank Inter American Dialogue.

O mundo de 2025 certamente não é o mesmo de quatro anos atrás. “O próprio Trump acabou decepcionado com a política de ‘pressão máxima’, que não gerou mudanças. Agora temos a migração venezuelana querendo chegar à fronteira dos EUA e uma guerra russa na Ucrânia e outra no Oriente Médio, algo que gera preocupações no nível energético”, analisa Carolina Jiménez Sandoval. Isso implica que, se Trump quiser deportar os venezuelanos por via aérea, terá que negociar com o país de origem. E se estiver interessado em continuar a exploração de concessões de petróleo na Venezuela, terá que relaxar as sanções.

Cartéis e fentanil

Um tema politicamente polêmico nos Estados Unidos é a crise de saúde causada pelo fentanil. O mesmo acontece com o crime organizado e os cartéis do México. “Trump vai pressionar muito o governo de Claudia Sheinbaum para agir”, prevê Michael Shifter.

Há vozes nos EUA exigindo medidas sobre o assunto. Alguns trumpistas chegaram a falar de intervenções militares no México para destruir laboratórios de fentanil e combater cartéis, o que implicaria uma violação da soberania daquele país.

“Isso criaria uma crise hemisférica, porque o México receberia solidariedade imediata e esmagadora de outros países latino-americanos, como Brasil ou Colômbia”, alerta Jiménez Sandoval. “Seria um precedente muito perigoso e abalaria seriamente o relacionamento entre EUA e América Latina”.

Disputa com a China

Desde sua vitória eleitoral, Donald Trump tem repetidamente ameaçado impor tarifas sobre produtos chineses. Sua guerra comercial com o gigante asiático pode determinar suas relações com os vários países latino-americanos que mantêm laços econômicos estreitos com a China.

“Trump sabe que isso não pode ser cortado da noite para o dia, mas pode haver mais pressão e ameaças de tarifas, para que esse relacionamento não continue a se aprofundar, para tentar reduzir a presença da China nas economias da região”, diz Shifter.

É nessa direção que iriam as ameaças de Mauricio Claver-Carone de sobretaxas de 60% sobre qualquer produto que passe pelo porto chinês de Chancay, no Peru. “Ameaças e pressão são as ferramentas que podemos esperar na grande competição China-EUA. Elas são as favoritas de Trump, esse é o estilo dele, mas o tiro pode sair pela culatra e aproximar essas economias ainda mais da China”, alerta o especialista em assuntos latino-americanos.

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